domingo, 1 de maio de 2011


Área nobre do Rio de Janeiro tem o dobro
de PMs por habitante do que zona norte

Para especialistas, distribuição de renda entre moradores e pontos turísticos influenciam
Marcelo Bastos, do R7 | 01/05/2011
Carlo Wrede / Agência O Dia
Carlo Wrede / Agência O Dia
Presença de UPPs em comunidades cariocas
têm alterado o mapa da violência
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Embora a mancha criminal seja um dos requisitos básicos para a distribuição do policiamento nas ruas do Rio de Janeiro, a zona sul da capital, que tem o menor índice de violência, segundo o ISP (Instituto de Segurança Pública), tem o dobro de policiais militares por habitante se comparada à zona norte, onde a incidência de crimes é muito maior. Enquanto um PM que atua na zona norte zela pela segurança de 675 pessoas, na zona sul a distribuição para cada profissional é em um raio de 325 pessoas.
A zona sul do Rio concentra a população de maior poder aquisitvo, em bairros nobres como Leblon, Gávea, Ipanema e Copacabana, muitos deles banhados pelo mar. Já a região norte da capital reúne a maior parte das favelas, entre elas os complexos do Alemão e da Penha.
Apesar de proporcionalmente ter menos da metade do efetivo de PMs da zona sul, a zona norte concentrou, por exemplo, metade dos homicídios ocorridos na capital, entre janeiro e dezembro do ano passado, 809 casos do total de 1.628. Já na região sul, foram registrados apenas 35 casos (3% do total).
Exemplos não faltam. No quesito roubo de veículos, 67% dos casos (7.993) ocorreram na zona norte, em 2010, enquanto a zona sul ficou com apenas 3% dos casos (396). Outro indicador considerado estratégico pela Secretaria de Segurança Pública, o roubo a pedestre, também apresenta grande diferença. Foram 36.295 casos na zona norte (57%) e 3.315 na zona sul (9%).
A região sul conta com aproximadamente 1.834 policiais, divididos em três batalhões, para dar segurança a 597.202 habitantes, de acordo com dados obtidos pelo R7, referentes ao início de 2010. Do outro lado da cidade, onde vive uma população quase cinco vezes maior - 2.820.617 habitantes - conta com 4.177 PMs, em oito batalhões, pouco mais que o dobro do encontrado na zona sul.
Quem vive na zona norte também sofreu com 63% dos casos de roubo seguido de morte (43 casos), 47% das tentativas de homicídio (740), metade dos roubos a estabelecimento comerciais (1.152), 59% dos roubos de carga (826) e 59% dos roubos dentro de coletivos (2.823).
Ao cruzar o túnel Rebouças, no sentido zona sul, a realidade é bem diferente. Na região, houve apenas 5% dos casos de roubo seguido de morte (4), 6% das tentativas de homicídio (96), 13% dos roubos a comércio (307), 5% dos roubos de carga (80) e 9% dos roubos dentro de coletivo.
Uma pessoa ligada à cúpula da PM confirmou que há muito tempo a distribuição de efetivo da corporação não sofre alterações e disse que um dos fatores dessa diferença seria o patrimônio turístico da cidade, cuja maior parte fica na área nobre carioca. Vale lembrar que a PM tem um batalhão exclusivo para policiamento em áreas turísticas.
Procurada, a Secretaria de Segurança Pública informou que a distribuição do efetivo é competência da Polícia Militar. A reportagem do R7 pediu à PM um responsável que pudesse comentar o assunto, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.
Renda da população influencia
Para a pesquisadora Sílvia Ramos, do Cesec (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania), da Universidade Cândido Mendes, a distribuição do número de policiais por habitante em uma região está diretamente ligada à concentração de renda dessa população.

- Essa situação mostra que a média de policiais em uma região depende do capital social dessa localidade, mais do que a mancha criminal. Isso é um padrão no mundo todo: áreas ricas têm mais policiais e são mais seguras. Antes se pensava que áreas ricas precisavam de mais policiais porque eram mais propensas a assaltos, mas não é bem assim. As áreas mais pobres, além de mais violentas, com altas taxas de homicídios, também têm mais roubos a pedestres e de carros, por exemplo, justamente porque não têm policiais suficientes.
Para o sociólogo e ex-secretário Nacional de Segurança Pública Luiz Eduardo Soares, as áreas mais nobres da cidade têm mais atenção não apenas das forças de segurança, mas também da própria imprensa. Segundo ele, o problema é crônico.
- É muito difícil que essas diferenças mudem em algum momento. E a razão disso é muito simples. Uma das maneiras mais dramáticas de desigualdade social é a desigualdade de acesso à Justiça. Áreas mais nobres têm mais atenção não apenas da segurança, mas da própria mídia. É lá onde vivem pessoas importantes e com maior poder aquisitivo. O ideal é que além do equilíbrio do número de policiais por habitante, como acontece na zona sul, também sejam feitas análises diárias e rigorosas da mancha criminal.
Concentração de favelas no subúrbio
Um dos motivos que explica a grande quantidade de crimes na zona norte é a grande quantidade de favelas dominadas pelo tráfico de drogas. Mesmo assim, a zona sul foi escolhida para receber as primeiras UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora).
Em quatro UPPs, a zona sul recebeu um incremento de 466 policiais, desde dezembro de 2008. A zona norte, que recebeu a primeira UPP em junho de 2010, já ganhou 1.197 policiais.
Com isso, a relação PM por habitante diminuiu, mas não o suficiente para fazer com que o número de policiais passasse a ser proporcionalmente igual nas duas regiões, levando-se em conta que a zona norte concentra a maior parte das favelas da capital. Enquanto na zona sul a relação passou para 259 pessoas para cada PM, na zona norte o índice diminuiu para um PM para cada 524 habitantes.
Segurança maior em comunidades com UPPs
Se considerarmos que os policiais lotados nas Unidades de Polícia Pacificadora patrulham apenas as favelas contempladas pelo projeto, a situação nas comunidades é melhor do que no asfalto. Nas 16 UPPs já instaladas, há aproximadamente 2.900 PMs, com uma população beneficiada diretamente de 231 mil pessoas, uma média de um policial para cada 80 moradores.
Na Cidade de Deus, em Jacarepaguá, na zona oeste da cidade, por exemplo, cerca de 45 mil moradores contam com 330 policiais, uma média de um PM para cada 136 moradores. Já no Santa Marta, em Botafogo, na zona sul, o índice é de um policial militar para cada 48 moradores. No morro do Salgueiro, na Tijuca, zona norte, o índice é de um PM para cada 28 moradores, já que são 4.000 pessoas sob a segurança de 140 PMs.

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